Não sou muito de postar matérias que faço pro jornal. Mas vou começar a fazer mais isso...
Se vocês não sabem, o que eu mais gosto neste mundo é de gente. Por isso, adoro fazer perfis. Segue o de hoje.
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A cruzada por uma pecuária moderna
Sebastião Ribeiro
Se tem algo que tira o veterinário Rafael Saadi do sério é a produtividade da pecuária gaúcha. Descendente de uma das mais tradicionais famílias de fazendeiros do Estado, o proprietário de três estabelecimentos rurais tem dedicado os últimos cinco anos a uma cruzada pessoal para disseminar técnicas que garantam mais eficiência na produção de gado.
_ A produtividade da pecuária gaúcha é de 50 quilos (vivos) por hectare, só que todo mundo tem vergonha de falar isso! Mas tudo bem, nem vamos entrar nessa polêmica. Vamos assumir os números oficiais, que são de 75 quilos por hectare (dados do Programa Juntos para Competir). Nós podemos passar disso para mais de 1 mil quilos por hectare apenas com fertilização do solo, manejo do gado e uso adequado das forrageiras _ brada Saadi, alguns tons de voz acima do que a conversa a dois em seu pequeno escritório na Capital sugere.
Quem conhece o produtor certamente já ouviu esse discurso, repetido sempre em palestras e reuniões de amigos. Recentemente, no entanto, a tese de Saadi ganhou força junto ao governo do Estado. Em entrevista a Zero Hora, o secretário do Desenvolvimento, Mateus Bandeira, citou o produtor rural como exemplo de que a pecuária gaúcha pode evoluir. Estimativa da secretaria, com base em dados da Fundação de Economia Estatística dão conta de que, se a produtividade da pecuária gaúcha quadriplicasse, o impacto positivo no Produto Interno Bruto estadual seria de R$ 12,8 bilhões. A convicção dos técnicos de que esses números são possíveis é reforçada pela experiências de Saadi, já relatadas pelo produtor a um grupo de secretários e membros do primeiro escalão do Palácio Piratini. Em cinco anos, desde que começou um projeto de modernização das técnicas na menor de suas propriedades, a Fazenda Cerquinha, de 530 hectares, em Vacaria, a produtividade saltou de menos de cem quilos de boi por hectare para 583 quilos. Esse resultado é exaltado em palestras que o pecuarista costuma dar em clubes de produtores, sindicatos rurais e outras associações.
_ O meu interesse é incentivar os produtores do Estado a deixar de serem como eu mesmo era, quando preferia comprar campo do vizinho, em vez de investir mais na minha área. Com essa mentalidade, estamos morrendo aos poucos. E todos temos responsabilidade por isso _ desabafa Saadi.
O escritório do produtor rural fica em uma casa modesta de madeira, escondida feito fortaleza atrás de um muro alto com câmera de vigilância. A simplicidade do local contrasta com os modos elegantes e a gravata bem alinhada do encarregado que abre a porta. Postado atrás de um mini laptop e defronte a uma grande televisão, Saadi consulta com frequência o livro que publicou ano passado detalhando o sistema de produção que propõe. Atrás do produtor, um quadro do início do século passado mostra a paisagem da fazenda Três Marias, do avô, em Bom Jesus: um rebanho à beira do açude, tendo um capão de mato com araucárias ao fundo. É a vista da sede da propriedade, a primeira a ter luz elétrica na região, antes mesmo das cidades. O fazendeiro, no entanto, garante que suas propostas não são apenas para a elite rural da qual faz parte.
_ Pelo contrário. São melhores para a pequena propriedade, para os assentamentos de reforma agrária. O pequeno produtor pode usar o dejeto do do suíno ou do frango que cria para fertilizar o solo. E pode semear a pastagem e manejar o gado sozinho _ afirma Saadi.
A convicção de que é possível multiplicar a produtividade gaúcha e chegar aos 1 mil hectares, o produtor tira de suas viagens periódicas ao Exterior. Mesmo quando vai acompanhado da família _ é casado e tem cinco filhas _, Saadi diz aproveitar os roteiros para aprender, visitando fazendas em outros países. Seu modelo ideal é a Nova Zelândia, que teria características semelhantes ao Rio Grande do Sul, e ostenta produtividade de 1 mil quilos de boi por hectare ao ano. Na Fazenda Cerquinha, o produtor pretende chegar a essa marca em 2010.
Saadi fala como um sonhador. Seu sonho ultrapassa as porteiras das próprias terras. Tem algo de transcendental, que fica mais fácil de entender ao se ouvir uma passagem de sua vida.
_ Aos 18 anos, eu tencionava tirar física nuclear nos Estados Unidos. Porque, como homem do campo, quando me deitava na relva à noite e olhava o firmamento, me dava conta da pequenez da gente diante do universo. E o átomo tem as mesmas forças de atração e repulsão do universo. Mas, por pressão da família, terminei tirando medicina veterinária em Porto Alegre.
Se desistiu de lidar com as forças do átomo, Saadi não cansa de desafiar a inércia da pecuária gaúcha. Para muitos, suas propostas não passam de utopia. A diferença é que agora ganham chance de virar realidade e extrapolar as porteiras das fazendas administradas pelo pecuarista. Podem compor um programa estadual de aumento da produtividade da atividade mais tradicional da economia gaúcha, em gestação na Secretaria do Planejamento.
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