"Não leio blogs; só o do Tião, porque é relevante", Filipe Maia, jornalista. "Às vezes o Tião escreve direitinho", Daniel Gallas, presidente. "Não gostar do Tião é uma falha de carácter", Rodrigo Müzell, jornalista. Sebastião Ribeiro é jornalista e mora em Porto Alegre. Leva uma vida pacata com a mulher e dois filhos em um apê no alto Rio Branco. A propósito, teu cu de bobes.
terça-feira, janeiro 25, 2011
Eu fico imaginando que um dia, num desses tantos acessos de raiva que eu tenho com o mundo, eu vou perder todos os meus amigos de uma tacada só. Porque nesses dias, eu tenho raiva de tudo, do guardinha que passa a noite toda ali vigiando com cara de cu, do meu vizinho que dança com a mulher de janela aberta, da do Louro José e até de mim e de você, sobretudo de você.
quinta-feira, janeiro 20, 2011
Este vídeo de Capão da canoa nos anos 50 é genial. Queria muito que o nosso estimado e falecido leitor Carioca estivesse aqui para ver: http://youtu.be/BqZsNoQ9O1Q
Depois, tem a reutilização das imagens, feitas pela moçada (adoro expressões de locutores de rádio) do Pergunte ao Crepe: http://bit.ly/ezsXFG
PS: Confio que nenhum leitor saiba o que é embedar.
sexta-feira, janeiro 14, 2011
De minha parte, gosto tanto de videogames que não os tenho. Comprar um Wii ou PS3 seria uma autossabotagem. Já não me dou o direito de trocar a telinha por horas com a família, muito embora tenha certeza de que sucumbiria ao vício caso estivesse ao meu dispor. E não precisaria tanto, um MegaDrive, MasterSystem ou Phanton System em minha telona já seriam o suficiente para me abduzir. Muda a tecnologia, mas a diversão é a mesma. Tudo termina em salvar a princesa.
O diabo é que descobri os joguinhos de celular. Agora, não somente estou com uma plataforma à disposição como a tenho 24 horas por dia (literalmente) à minha mão. Deu uma brecha no mundo, lá estou eu matando ursos com pinguins, no Crazy Penguin Catapult.
Se tivesse de apontar um defeito nos jogos pra celular diria: são muito fáceis. Eu baixo um e já viro. O que não me impede de continuar jogando. No Smash Kart, genérico do Mario Kart, eu terminei todos os percursos em primeiro. No fim, foquei apenas na última e mais difícil pista: a Pista Espacial, do último mundo. Agora minha meta é reduzir meu tempo. Sempre. O inferno é que certa feita - lembro bem, foi na sala de espera do oculista - fiz a marca de 1'07''74. E nunca mais a superei. Já joguei um milhão de vezes depois disso. E digo: a marca obtida por mim é imbatível. Até para mim mesmo. Deve ser o recorde mundial do Smash Kart.
E com isso, ando eu numa obsessão infinita, querendo jogar o celular longe cada vez que perco para mim mesmo, em meio a uma dessas brechas do mundo, que são tantas...
O diabo é que descobri os joguinhos de celular. Agora, não somente estou com uma plataforma à disposição como a tenho 24 horas por dia (literalmente) à minha mão. Deu uma brecha no mundo, lá estou eu matando ursos com pinguins, no Crazy Penguin Catapult.
Se tivesse de apontar um defeito nos jogos pra celular diria: são muito fáceis. Eu baixo um e já viro. O que não me impede de continuar jogando. No Smash Kart, genérico do Mario Kart, eu terminei todos os percursos em primeiro. No fim, foquei apenas na última e mais difícil pista: a Pista Espacial, do último mundo. Agora minha meta é reduzir meu tempo. Sempre. O inferno é que certa feita - lembro bem, foi na sala de espera do oculista - fiz a marca de 1'07''74. E nunca mais a superei. Já joguei um milhão de vezes depois disso. E digo: a marca obtida por mim é imbatível. Até para mim mesmo. Deve ser o recorde mundial do Smash Kart.
E com isso, ando eu numa obsessão infinita, querendo jogar o celular longe cada vez que perco para mim mesmo, em meio a uma dessas brechas do mundo, que são tantas...
segunda-feira, janeiro 10, 2011
É um ritual que se impõe no início do veraneio. Despojado do chinelo, sai a caminhar. É preciso encascorar o pé. Estar preparado para qualquer eventualidade. De que natureza? Não pergunte. Também não sabe. Qualquer eventualidade, apenas.
Descalço, como uma tartaruga recém-nascida na Praia do Forte, entrega-se ao impulso que o leva em direção ao mar. No caminho, cem por cento do – volumoso, diga-se de passagem - corpo concentrados em 250 cm² de uma planta de pé.
Com o dedão, cava a areia que se deposita entre descombinados paralelepípedos e a lança ao ar. Sobre as pontiagudas pedrinhas de asfalto, enfim compreende o sadomasoquista: é sádico ao maltratar seus pés e masoquista ao gozar com a dor auto-infligida. Na grama indomada dos terrenos baldios, há se de pisar firme e fazer cara feia para amedrontar as rosetas. As raras calçadas bem cuidadas são oásis de alívio no caminho. Os pisos se sucedem de forma mais desafiadora do que os programas randômicos das esteiras de academia.
É preciso encascorar... É preciso sofrer até sentir a areia da praia acariciando o entrededos, a água gelada do mar anestesiando o corpo, de cima para baixo. Faz parte do ritual banhar-se olhando para a frente. Seguir caminhando como se em terra firme até ter o oceano na altura dos calcanhares, dos joelhos, do púbis, do umbigo, do peito. E só então mergulhar, parar e olhar firme para o fim do mundo, de costas para os espigões e para a praia que mais parece um campo de batalha com suas tropas, abaladas pela chuva, batendo em retirada e deixando para trás armas e mantimentos. Lixo, puro lixo.
Cada onda concentra em si a energia de um vento, de muitos ventos, se assim se pode dizer, que sopraram centenas de quilômetros à frente. Uma onda batendo forte no peito é a comunhão maior do homem com a natureza, assim como o pé descalço no asfalto o é com a obra humana. É preciso encascorar, para enxergar toda a beleza da imundície do homem.
Redimido com a natureza e com a obra humana, é hora de voltar, de fazer as pazes com com o homo sapiens sapiens. A ida já lhe deu o casco e a confiança necessários para caminhar sem olhar para o chão. Está pronto para enxergar seus pares. É bom ver-se de calção do Grêmio e cueca samba-canção, as banhas debruçando-se sobre o elástico na cintura, pelas ruas de Tramandaí. É reconfortante fazer parte da massa de homens obesos e suados por carregar seus isopores até há pouco repletos de latinhas de cerveja, ao lado de suas mulheres vermelhas sapecadas de sol, a pele sempre escorregando para fora do maiô. Ele vê aquela turma na varanda do condomínio de casas geminadas, dando risada com o CD do Guri de Uruguaiana, o casal de Sapucaia namorando no carro ao som do Musical JM, o negro corpulento de sunguete berrando bêbado por onze quadras que vai matar um brigadiano... e já não sente asco. Pelo contrário: encontra certa beleza e imagina-se parte de tudo isso. Acha que porque é gordo e porque usa calção de time de futebol e porque seu filho também tem um baldinho de areia em forma de peixe, pertence à grande massa, e isso lhe conforta. Está feliz porque não tem preconceitos.
O encascorar dos pés, o banho de mar, o conviver com os colegas humanos. No dia em que o mar o chama como às tartarugas da Praia do Forte, tudo isso faz parte. Só é preciso estar no Litoral Gaúcho. Fosse em Atlântida, ele rogozijar-se-ia por assintosamente desfilar seu calção tricolor entre o mar de bermudas coloridas com fecho de velcro e cordinha, daquelas que muito já usou - e ainda usa. Fosse em Torres, filosofaria sobre a relação entre o deterioramento de sua forma física e a decadência do bom gosto na praia: a cada quilo ganho, um espigão construído, uma suburbana à beira-mar, um cagalhão no mar dos Molhes... Ainda assim, lembrar-se-ia, tomado por uma dor gostosa, daqueles tempos em que todos eram belos - inclusive ele, embora só o tenha descoberto anos depois, olhando fotos antigas.
Tantas vezes encascorou os pés em Torres, Atlântida, Tramandaí... E sempre foi um ritual bonito, este. Que venham os dias de praia da temporada! A planta do pé está que é uma lixa. Agora, sim, está preparado para qualquer eventualidade.
***
PS1: Para sentir-se feliz fazendo parte da massa em Tramandaí, usar calção de futebol à beira-mar de Atlântida e horrorizar-se com a decadência de Torres, é preciso fingir que você paira sobre tudo e todos, que enxerga o mundo soberbamente de um patamar superior. É preciso fingir que você no fundo não faz parte de tudo isso. É preciso fingir que não tem preconceitos. Mas faz. Mas tem.
***
PS2: Borrifar veneno nas formigas proporciona sensação de poder.
Descalço, como uma tartaruga recém-nascida na Praia do Forte, entrega-se ao impulso que o leva em direção ao mar. No caminho, cem por cento do – volumoso, diga-se de passagem - corpo concentrados em 250 cm² de uma planta de pé.
Com o dedão, cava a areia que se deposita entre descombinados paralelepípedos e a lança ao ar. Sobre as pontiagudas pedrinhas de asfalto, enfim compreende o sadomasoquista: é sádico ao maltratar seus pés e masoquista ao gozar com a dor auto-infligida. Na grama indomada dos terrenos baldios, há se de pisar firme e fazer cara feia para amedrontar as rosetas. As raras calçadas bem cuidadas são oásis de alívio no caminho. Os pisos se sucedem de forma mais desafiadora do que os programas randômicos das esteiras de academia.
É preciso encascorar... É preciso sofrer até sentir a areia da praia acariciando o entrededos, a água gelada do mar anestesiando o corpo, de cima para baixo. Faz parte do ritual banhar-se olhando para a frente. Seguir caminhando como se em terra firme até ter o oceano na altura dos calcanhares, dos joelhos, do púbis, do umbigo, do peito. E só então mergulhar, parar e olhar firme para o fim do mundo, de costas para os espigões e para a praia que mais parece um campo de batalha com suas tropas, abaladas pela chuva, batendo em retirada e deixando para trás armas e mantimentos. Lixo, puro lixo.
Cada onda concentra em si a energia de um vento, de muitos ventos, se assim se pode dizer, que sopraram centenas de quilômetros à frente. Uma onda batendo forte no peito é a comunhão maior do homem com a natureza, assim como o pé descalço no asfalto o é com a obra humana. É preciso encascorar, para enxergar toda a beleza da imundície do homem.
Redimido com a natureza e com a obra humana, é hora de voltar, de fazer as pazes com com o homo sapiens sapiens. A ida já lhe deu o casco e a confiança necessários para caminhar sem olhar para o chão. Está pronto para enxergar seus pares. É bom ver-se de calção do Grêmio e cueca samba-canção, as banhas debruçando-se sobre o elástico na cintura, pelas ruas de Tramandaí. É reconfortante fazer parte da massa de homens obesos e suados por carregar seus isopores até há pouco repletos de latinhas de cerveja, ao lado de suas mulheres vermelhas sapecadas de sol, a pele sempre escorregando para fora do maiô. Ele vê aquela turma na varanda do condomínio de casas geminadas, dando risada com o CD do Guri de Uruguaiana, o casal de Sapucaia namorando no carro ao som do Musical JM, o negro corpulento de sunguete berrando bêbado por onze quadras que vai matar um brigadiano... e já não sente asco. Pelo contrário: encontra certa beleza e imagina-se parte de tudo isso. Acha que porque é gordo e porque usa calção de time de futebol e porque seu filho também tem um baldinho de areia em forma de peixe, pertence à grande massa, e isso lhe conforta. Está feliz porque não tem preconceitos.
O encascorar dos pés, o banho de mar, o conviver com os colegas humanos. No dia em que o mar o chama como às tartarugas da Praia do Forte, tudo isso faz parte. Só é preciso estar no Litoral Gaúcho. Fosse em Atlântida, ele rogozijar-se-ia por assintosamente desfilar seu calção tricolor entre o mar de bermudas coloridas com fecho de velcro e cordinha, daquelas que muito já usou - e ainda usa. Fosse em Torres, filosofaria sobre a relação entre o deterioramento de sua forma física e a decadência do bom gosto na praia: a cada quilo ganho, um espigão construído, uma suburbana à beira-mar, um cagalhão no mar dos Molhes... Ainda assim, lembrar-se-ia, tomado por uma dor gostosa, daqueles tempos em que todos eram belos - inclusive ele, embora só o tenha descoberto anos depois, olhando fotos antigas.
Tantas vezes encascorou os pés em Torres, Atlântida, Tramandaí... E sempre foi um ritual bonito, este. Que venham os dias de praia da temporada! A planta do pé está que é uma lixa. Agora, sim, está preparado para qualquer eventualidade.
***
PS1: Para sentir-se feliz fazendo parte da massa em Tramandaí, usar calção de futebol à beira-mar de Atlântida e horrorizar-se com a decadência de Torres, é preciso fingir que você paira sobre tudo e todos, que enxerga o mundo soberbamente de um patamar superior. É preciso fingir que você no fundo não faz parte de tudo isso. É preciso fingir que não tem preconceitos. Mas faz. Mas tem.
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PS2: Borrifar veneno nas formigas proporciona sensação de poder.