segunda-feira, dezembro 12, 2005

Andréa - PARTE 2

Cincoenta reais...
Cincoenta reais...
Cincoenta reais...
Cincoenta reais!
Aquilo caiu sobre minha cabeça como o fardo cai na cuca do estivador. Tonteei, tive de segurar um grito estridente na goela, controlar o impulso de abrir a porta de Andréa e tirar as caras. Fiz um esforço descomunal para manter um ar despreocupado, de “só isso?”, assinei o cheque e dei boa tarde.
Cincoenta reais! Dezesseis cervejas no Ladislau. Cincoenta reais! Dois boquetes e meio na Farrapos. Cincoenta reais! Dez diárias de clássicos na Back Vídeo. Cincoenta Reais! Churrasco de picanha pra dez. Cincoenta reais! Complete a lista.
Entrei no carro atônito, esqueci meu destino. Aos poucos, acalmei - afinal, entre 50 e 30 são só 20. E também não podia dizer que as mãos de Andréia não eram gostosas, que Andréa não manejava bem a tesoura, que meu penteado não estava cool. Mas daí a deixá-las me lograr já era demais.
Pensei em escrever uma carta (Andréa, legal tua tattoo e bacana aquele esqueminha que fazes com a tesoura, mas não achas que Cincoenta é um abuso?), em iniciar uma pesquisa em todos os coiffeurs chiques de POA para provar que a conta foi um tanto injusta, em denegrir a imagem de Andréa pelos bares da vida.
Mas logo veio a vergonha. Eu fora um babaca. Mais um otário seduzido pelo glamour do Sexton. Como o tal que caiu no golpe da loteria, tinha de silenciar. Mesmo se perguntado, negar categoricamente ter pago 50 para Andréa (aliás, será que meu primo não pagou R$ 50 prá Baiana e só estava com vergonha de dizer), sob pena de ser alvo de chacota na CB.
Por fim, decidi me abrir. Preciso mesmo desabafar, dividir meu drama, receber o ombro amigo, tirar este fardo da minha cabeça. Já à noite, no bar do Ladislau, gritei para quem quisesse ouvir: “sim, eu paguei R$ 50 para cortar o cabelo, este mesmo cabelinho que vocês estão vendo”.
E agora estou aqui, num ato de bravura, confessando tudo. Venham com pedras ou com palavras amigas. Só sei que me sinto mais leve. Quase voltando na Andréa.

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