quinta-feira, março 13, 2008

Tenho um amigo que é meio atrapalhado com estes troços de noivado.
Passa que a irmã dele vai casar em novembro, e ela é mais nova, e sabe como são estas coisas: ele, mais velho, enrolando há anos uma pobre moça e daí vem a sacana da maninha e não só noiva (do verbo noivar!) como marca igreja, salão, lua-de-mel. O que, por óbvio, gerou uma injusta pressão sobre meu camarada e a respectiva dele para que, enfim, ao menos sinalizassem à família e à sociedade e a si mesmos um desejo de união eterna.
O problema é que noivar envolve aquela coisa de alianças. Anéis, para ser mais objetivo. E a troca das jóias normalmete exige uma certa solenidade. A Pati e o Gui, por exemplo. Era Natal, a família reunida, aquela coisa, entrega de presentes, todo mundo louco para pôr as mãos no peru... Um lance meio família Doriana, sabem? Aliás, eu tenho um amigo cujo apelido é Dori... Ops, ele não sabe. Mas, enfim, até o cachorro do casal ia ganhar um mimo do Noel. Por isso mesmo o cãozinho, um shi-tsu, aquele que parece lhasa mas tem a cara achatada de pequenês, apareceu na sala com um laçarote no pescoço. E então, quando a Pati foi ver, o bichinho trazia uma caixinha amarrada na coleira, e dentro da caixinha... Bingo: as alianças! E todos choraram e se emocionaram e são felizes para sempre. Tem também a história do Caetano, que optou pelo tradicional jantarzinho romântico. Papo vai, papo vem, o vinho rolando, e ele começa a mexer no dedinho da moça. Tira, bota, tira, bota, tira, bota - o anel no dedo da guria, claro. Até que, num passe de prestidigitador, troca o anel que a moça usava por uma jóia mais rara, a aliança propriamente dita. Quando ela se dá conta, é aquela comoção! E o final todos sabem: brigaram, se separaram e hoje ele está bem casado com outra menina e até filhote já tem.
Mas estamos aqui para falar do outro amigo, aquele que é meio atrapalhado com estes troços de noivado. Pois bem, retomando: pressionado pelas circunstâncias e embalado pelo amor, ele resolveu agir. Já sabendo das próprias dificuldades, optou pelo básico: viagem a dois para marcar o momento. Mas a verdade é que queria acabar logo com aquilo - a necessidade de planejar alguma coisa bonita o estava enlouquecendo. Tanto que no próprio aeroporto Salgado Filho ele, atormentado, fez a seguinte proposta.
- Amor, vamos acabar logo com esta coisa. Bobagem a gente ter de fazer uma função para noivar. Trocamos aqui mesmo no saguão as alianças e tá tudo feito. Daí a gente já aproveita a viagem relaxados.
A resposta da moça, claro, nós já sabíamos: na na ni na na. E lá se foi o casal para o Rio, em pleno Carnaval, com a única missão de formalizar a união. Para não complicar, a opção foi o jantarzinho básico - de novo ele. Escolheram um restaurante charmoso na Barra da Tijuca. Para chegar lá, até barquinho tiveram de pegar. O lugar não poderia ser melhor para o momento - quer dizer, até podia, Veneza, uma gôndola, um violino... Mas, considerando as circunstâncias, de novo elas, aquele jantarzinho à beira d´água estava ótimo. Ou melhor, estaria ótimo.
Porque, em vez de tranqüilamente pedirem o antepasto, o vinhozinho, o prato principal, a sobremesa e trocarem as alianças, se puseram a debater qual o melhor momento para o ato.
- Antes do couvert - dizia ele.
- Depois da janta - dizia ele.
E o clima foi se desfazendo, se desfazendo, se desfazendo... até que ela entrou em pânico.
- Eu não vou mais. Aqui, no meio deste povo, não vou. Tenho vergonha. Todo mundo vai olhar. Não, não e não.
Pois é. Como vocês podem ver, não é só meu amigo que é atrapalhado com estes troços de noivado. A mulher dele também é. De forma que os dois deixaram o restaurante, literalmente, de mãos abanando. Assim como foram, os dedinhos voltaram para o hotel. Os candidatos a noivos chegaram abatidos e desanimados. Sem saco até para caminhar entre a torre principal do estabelecimento à secundária, onde ficava o quarto do casal. Preferiram usar o carrinho elétrico de golfe, que levava os mais preguiçosos pelo curto trajeto. Sentados no banquinho de trás, os dois olhavam o jardim, quietos. Em absoluto silêncio. Até que, em um rompante, o meu amigo abriu a caixinha com as alianças e enfiou no dedo da noiva. Assim mesmo: enfiou. Quando o negrão que conduzia o carrinho estacionou, o noivo apenas pediu.
- O senhor podia tirar uma foto, por favor? Ahn... Acabamos de noivar.
Prontamente, o motorista atendeu ao pedido e, olhando para as duas alianças, caiu na gargalhada. Meu amigo e a mulher dele agradeceram e subiram ao quarto. Foram dormir o sono pesado do dever cumprido e da felicidade. A foto dos dois no carrinho está hoje num porta-retratos.
Pensando bem, talvez eles nem sejam assim tão atrapalhados com estes troços de noivado.

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